terça-feira, 4 de setembro de 2007

PEDAGOGIA DO OPRIMIDO

Paulo Freire: "Aquele que, no meio da noite, fez estalar o sol."
Pode parecer redundante assinalar a importância de Pedagogia do oprimido no contexto educativo internacional, já que esse livro foi traduzido para mais de dezoito idiomas e tem, em alguns casos, mais de trinta reimpressões, como por exemplo em espanhol.
Por um lado, Pedagogia do oprimido apresentou uma crítica devastadora dos fundamentos da pedagogia tradicional e de sua alternativa, a "Escola Nova", e, ao mesmo tempo, um princípio político-pedagógico novo. Neste sentido, esse livro colocou o trabalho e o pensamento de Paulo Freire como a grande revolução pedagógica da segunda metade deste século, comparável e, quanto a certos temas, superior às contribuições do outro grande filósofo educacional e pedagogo da primeira metade deste século, John Dewey.
Por outro lado, Pedagogia do oprimido apresentou uma sistematização das bases antropológicas para uma educação libertadora e uma reinterpretação das relações entre filosofia, educação e política. Interpretação essa que poderia integrar-se de maneira coerente com a análise de Gramsci sobre a construção de um novo senso comum e intelectuais orgânicos na busca de uma nova hegemonia, ou com a contribuição da Escola de Frankfurt, especialmente com o filósofo alemão Jürgen Habermas e seu intento de confrontar a colonização de mundo da vida cotidiana (lifeworld) e a criação de um "discurso ideal", que permita a comunicação emancipadora entre os seres humanos. Sem dúvida alguma, Pedagogia do oprimido mostra uma convergência fundamental entre Paulo Freire e Jürgem Habermas, no estudo de uma psicologia social crítica, e de Paulo Freire e Antonio Gramsci, na determinação de uma política como transformação social.
Finalmente, Pedagogia do oprimido, ao estabelecer suas premissas epistemológicas e metodológicas numa crítica ao positivismo lógico e pedagógico, ao privilegiar uma concepção hermenêutica do conhecimento humano como decisivo para as ciências humanas, e ao procurar basear a validade do conhecimento em processos de discursos racionais, que podem comunicar-se entre si, e daí a ênfase no diálogo, a reflexão compartilhada, a análise teórica a partir da experiência da cotidianeidade, não apenas oferece uma crítica à dominação e à exploração social, como também postula componentes, reais e utópicos, de uma teoria pedagógica emancipadora. Isso será, sem sombra de dúvida, o que causará forte impacto sobre grande número de intelectuais críticos, como por exemplo Henry Giroux, Peter McLaren, Ira Shor ou Michael Apple, para citar apenas alguns que trabalham nos Estados Unidos.
Comemoramos agora o 25º aniversário da Pedagogia do oprimido que é uma comemoração não apenas de um livro que se constituiu, por direito próprio, num clássico da pedagogia progressista, mas também a comemoração de uma utopia de transformação social, nascida no calor de lutas sociais na América Latina, e que continua ainda excitando a imaginação de educadores e de intelectuais. Talvez valha a pena concluir parafraseando o escritor mexicano Carlos Pellicer que, ao se referir à Revolução Mexicana (uma revolução, qualquer revolução), ofereceu-nos um fragmento épico que poderia aplicar-se ao pensamento de Paulo Freire e à Pedagogia do oprimido: "Aquele que deu liberdade ao fogo para incendiar, para destruir a sombra construída com mentiras. O Capitão das cores com voz e voto, aquele que, no meio da noite, fez estalar o sol".

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